domingo, 23 de junho de 2019

West Ham 1 Arsenal 0 – Final da FA Cup 1980


Série Grandes Jogos

A última grande conquista dos Hammers veio na copa mais charmosa e tradicional do mundo e contra um vizinho de Londres, mesmo (como acontecera em 1975 quando os Hammers bateram os Cottagers)!

O Arsenal fazia sua terceira final consecutiva, enquanto os Hammers eram um time de Second Division logo, na opinião dos comentaristas esportivos, os Hammmers eram os azarões!

Mas a mágica aconteceu naquela tarde iluminada de maio de 1980...

Maiores detalhes desta conquista inesquecível abaixo.

Boa leitura.

1. Programa oficial da final da FA Cup de 1980 (eBay)

A última martelada dos Hammers

Em maio de 1980 Margaret Thatcher era Primeira Ministra há apenas 12 meses, Dexy’s Midnight Runners estava em primeiro lugar nas paradas musicais e o hooliganismo continuava a arruinar o futebol inglês.

Upton Park, em dias de jogos, era um lugar perigoso, com batalhas campais nas estações de metrô locais, dúzias de cães policiais conduzindo torcedores para entrar ou sair do campo e cercas de arame farpado separando torcedores rivais.

Os temíveis hooligans do setor norte da Inter City Firm (ICF) estavam entre os mais notórios disseminadores da violência no futebol. O Relatório Taylor (Taylor Report) e o glamour da Premier Legue ainda estavam 12 anos distantes. Mas algumas coisas nunca mudavam como, por exemplo, o Liverpool ganhar o campeonato da First Division por dois pontos do Manchester United.

De qualquer forma nada disso importava para os 100.000 espectadores no campo num dia maravilhoso no começo de maio. Para os torcedores do West Ham, bater o Arsenal na final da FA Cup em Wembley é o melhor que se poderia obter.

O clube havia ganhado a FA Cup em duas ocasiões anteriores, mas a final de 1980 é muito especial e permanece vívida na memória e no inconsciente coletivo do clube do Leste de Londres. Para aqueles que têm bastante idade e foram afortunados o suficiente de estar no velho estádio naquele sábado ensolarado de primavera, a memória simplesmente é inesquecível.

Para os padrões erráticos do clube o caminho até Wembley foi estranhamente fácil, pelo menos até a semifinal. Após levar a melhor num replay da terceira fase contra o West Brom por 2 a 1, os vizinhos do Orient forma despachados por 3 a 2 em Brisbane Road.

2. Momento em que Trevor Brooking cabeceia para as redes (Getty Images)

O West Ham tinha superado a sua costumeira vulnerabilidade pós-Natal e podia aguardar com confiança os embates em campos primaveris. As partidas da quinta e da sexta fase trouxeram seguras vitórias em casa às custas de Swansea e Aston Villa, respetivamente, e os torcedores começaram a ter esperanças.

Os Hammers conquistaram o seu lugar em Wembley após uma dura batalha dupla na semifinal, ganhando de 2 a 1 no replay.

A semifinal contra o Everton será melhor lembrada pelos fãs do West Ham pelo gol que deu à vitória no finzinho do jogo, um mergulho de cabeça de Frank Lampard. Sua absurda rotina de celebrar correndo em direção aos fãs do West Ham antes de uma dancinha improvável próximo da bandeirinha de escanteio permanece vívida na memória.

Mas certamente o homem da partida foi Alan Devonshire. O elegante meio-campista jogou um excelente futebol com Brooking, uma das melhores partidas já vista em Upton Park. Devonshire, uma figura cultuada no clube, dominou o meio de campo naquele dia e marcou um gol inesquecível driblando o que parecia ser todo o time do Everton antes de rolar a bola para as redes de um desesperado goleiro adversário.

Os oponentes do Arsenal chegaram à final após quatro exaustivos jogos contra o poderoso Liverpool. Muitos observadores neutros e comentaristas queriam uma final entre Arsenal e Liverpool naquele ano e ficaram frustrados quando o sorteio pôs os dois rivais da First Division frente a frente nas semifinais.

A final de 1980 foi a 99ª jogada no estádio de Wembley. Os Hammers chegaram à final em cinco ocasiões, enquanto os seus ilustres vizinhos do Norte de Londres tinham disputado as duas últimas finais e era um time formidável da First Division.

3. Pat Jennings tentando deter o avanço da bola, após cabeçada de Trevor Brooking que aparece sentado na foto (Getty Images)

Embora a maioria dos torcedores dos Hammers aceitasse que o seu time era um tremendo azarão, o capitão Billy Bonds pensava diferente: “Nós realmente não vamos para o jogo pensando que somos azarões porque, embora sejamos um time da Second Division, nós temos vários bons jogadores na equipe. Se você olhar para o time, muitos deles se tornariam lendas no clube.”

Bonds tinha um ponto de vista. Você podia enumerar os nomes: Trevor Brooking, Phil Parks, Frank Lampard, Alvin Martin, Alan Devonshire e, é claro, o próprio Bonds. Os fãs deveriam perguntar a si mesmos o que este time estava fazendo na Second Division.

Mas o capitão de 32 anos do West Ham tinha razões para estar confiante. Bonds era um jogador muito experiente e capitão do vitorioso time vencedor da FA Cup em 1975 e mais ou menos recuperado do seu longo período de contusões. Mas, apesar da confiança do capitão em seu time, o time do Norte de Londres era o franco favorito para todos naquele dia.

Fãs dos Hammers chegando no estádio sem uma entrada não teria tido problema porque eles poderiam encontrar um cambista amigo disposto a se separar da entrada do Setor dos Hammers por razoáveis 30 libras.

Eles podiam, então, se juntar aos torcedores de ambos os times se dirigindo para Wembley cheios de expectativas. A área em torno da entrada do estádio era um mar das cores grená e azul e o barulho daqueles já dentro do estádio contribuiu para a crescente animação.

A véspera do jogo passou num instante antes dos times, ambos em suas cores tradicionais, serem conduzidos para o campo pelos seus respectivos treinadores, John Lyall e Terry Neill.

4. Trevor Brooking comemorando o gol marcado no jogo (Getty Images)

Antes do pontapé inicial os dois capitães, Bonds e Pat Rice, apresentaram os seus times para o Duque e a Duquesa de Kent, enquanto “eu estou sempre soprando bolhas” era cantada ao redor do gramado afogando qualquer tentativa dos fãs do Arsenal de serem ouvidos. Naquele momento, segundos antes das três da tarde, a atmosfera estava eletrizante.

Então algo muito estranho aconteceu. Uma imponente figura vagueou pelo gramado, carregando meia dúzia de câmeras ao redor do pescoço e tomou o lugar à direita do gol do setor da torcida do West Ham.

Para a confusão absoluta dos torcedores rivais, os Hammers começaram a cantar fervorosamente em alto e bom som: “Só existe um Stevie Bacon, um Stevie Bacon.”

Os fãs estavam prestando o seu próprio tributo ao lendário cinegrafista, Steve Bacon, que se tornou o fotógrafo oficial do clube. Bacon foi amado e respeitado em Upton Park e o tributo dos fãs foi um gesto genuíno de admiração e gratidão por um deles mesmos.

O jogo começou com o Arsenal tendo maior posse da bola, com Brady controlando o jogo, mas os Hammers tinham um plano de jogo e se recusaram a dar muita liberdade ao grande irlandês em Wembley.

5. Trevor Brooking perseguindo Liam Brady durante o jogo (Getty Images)

John Lyall havia apostado ao escolher o jovem meio-campista Paul Allen em vez de outro jogador mais experiente. Lyall, um hábil estrategista nos moldes de Greenwood, orientou Allen, o jogador mais jovem a aparecer numa final de FA Cup, com 17 anos e 256 dias, a grudar em Brady e impedi-lo de ditar o ritmo do jogo.

O adolescente e o perseverante Geoff Pike lutaram incansavelmente para interromper a normalmente fácil troca de passes do Arsenal. Ao pressionar os melhores jogadores do adversário, estas duas figuras anônimas deram aos dois mais criativos meio-campistas dos Hammers, Devonshire e Brooking, diversas oportunidades de contra-ataque.

Com Allen mordendo os seus calcanhares Brady se tornou menos efetivo e então ocorreu um milagre em grená e azul. Aos 12 minutos, com os Hammers forçados a jogar no contra-ataque, Devonshire surgiu livre na ponta esquerda e fez um cruzamento caprichoso em direção à região da marca do pênalti dos Gunners. A bola caiu em direção do centroavante David “Psico” Cross, cujo chute à meia altura foi defendido por Pat Jennings.

O rebote caiu perto de Stuart Pearson, cujo chute ao gol resvalou num zagueiro do Arsenal. Quem estava esperando era o astro dos Hammers e da Inglaterra, Trevor Brooking, que se aproveitou e desviou a bola pra dentro das redes, de cabeça, quase caído no chão. A celebrada defesa dos Gunners ficou impotente.

Sim, Brooking marcou com uma cabeçada na final da FA Cup contra o Arsenal – um milagre, sem dúvida – e o West Ham estava à frente no placar. Não precisava dizer nada, os fãs dos Irons foram à loucura e não foi a última vez, naquela tarde de maio, que o rugido dos Bubbles ecoou pelo estádio.

Brooking deve ter saboreado o momento. Alguns dias antes da partida o treinador do Nottingham Forest, Brian Clough, escolheu Brooking para suas críticas quando ele insinuou que o elegante meio-campista parecia uma borboleta em campo: muito delicado e pouco efetivo.

6. Brian Talbot protege a bola observado por David O'Leary, enquanto Stuart Pearson, dos Hammers, o persegue (Getty Images)

Clough acusou o clube do leste londrino de estar mais interessado no glamour de Wembley do que em ser promovido de volta à First Division, não que isso fosse uma novidade do Velho Linguarudo. Mais tarde Clough se desculparia com Brooking pela sua observação deselegante.

Uma vez tendo assumido a liderança no placar conseguiriam os Hammers mantê-la? Os Gunners dominaram os últimos trinta minutos do primeiro tempo, mas a defesa do West Ham segurou firme, com Bonds e o excepcional goleiro Parkes.

Os melhores esforços de Sunderland, Stapleton e Rix deram de frente com uma sólida defesa em grená e azul. Os londrinos do leste chegaram ao intervalo com a defesa invicta.

Durante o intervalo os fãs dos Hammers especularam nervosamente sobre o que aconteceria no segundo tempo. Ao longo do ano eles se tornaram calejados com a decepção, mas pela evidência dos primeiros 45 minutos eles tinham o direito de acreditar que os seus sonhos não se desvaneceriam e morreriam.

O segundo tempo continuou no mesmo ritmo do primeiro, mas com uma encorajadora exceção. Assim que Devonshire e Brooking cresceram em confiança, eles começaram a se infiltrar na defesa do Arsenal.

A retaguarda dos Hammers tocou o coração dos seus companheiros com intenção de atacar, assim que eles entenderam que tudo o que o cansado Brady poderia fazer seria contido por eles.

7. Trevor Brooking é perseguido por Brian Talbot (Getty Images)

Com minutos restando para o apito final, as hordas grená e azul começaram a se preparar para a vitória. O seu time quase marcou um segundo gol, o que não teria dado margem de dúvidas na final da FA Cup de 1980.

O jovem Allen penetrou na defesa dos Gunners e com somente Pat Jennings a ser batido, ele foi cínica e cruelmente derrubado por um impressionante carrinho de Willie Young. Young permaneceu em campo e somente recebeu um cartão amarelo – a regra do último homem da defesa ainda não havia sido introduzida.

Mas a justiça foi feita quando o juiz apitou o fim do jogo minutos depois e os exultantes torcedores dos Hammers puderam finalmente celebrar.

Billy Bonds recebeu a taça da FA Cup do Duque de York. Ele virou para a esquerda e ergueu o troféu alegremente para as vitoriosas legiões de fãs do West Ham abaixo. Desta vez a sorte não abandonou os Hammers e os londrinos do leste puderam aproveitar o seu momentâneo lugar ao sol.

Na verdade a partida foi um jogo muito irritante e maçante – as finais de FA Cup frequentemente se desenrolam dessa maneira, com ambos os times inibidos pelos nervos e o medo de errar. Mas este pensamento negativo nunca passou pela mente dos torcedores enquanto faziam o caminho de volta de Wembley.

Conforme eles se aproximavam da estação de metrô, descendo para a plataforma subterrânea, uma explosão espontânea de cantos irrompeu e continuou dentro da plataforma e dentro dos trens em direção ao leste. Um por um todos torcedores cantaram o seu tributo às lendas do passado do West Ham, com destaque dado ao santo Bobby Moore.

8. Jogadores exibindo a taça para uma torcida ensandecida, da esquerda para direita: Billy Bonds, David Cross, Trevor Brooking e Frank Lampard (Getty Images)

No dia seguinte o sol continuou a brilhar na procissão da vitória, que começou em Stratford Broadway, atravessando a rua do pub de Bobby Moore, o Mooro’s.

A polícia estimou que ao redor de 200.000 pessoas alinharam-se nas ruas do Leste de Londres para mostrar o seu apreço e se juntar à diversão. O ônibus aberto do time levou umas duas horas para cobrir a curta trajetória até o seu destino, East Ham Town Hall.

Trevor Brooking expressou os seus próprios sentimentos sobre a recepção ao time naquele domingo: “a velha East End sabia como celebrar e as pessoas vieram dos hospitais ou com seus bebês. A atmosfera estava fantástica naquele domingo porque uma vitória como aquela contra o Arsenal era algo que o East End queria celebrar. Eu sempre me lembrarei disto.”

Billy Bonds mais tarde diria que ele não podia lembrar muito da celebração porque teve que colocar o técnico do clube, Ernie Gregory, e o fisioterapeuta, Rob Jenkins, na cama cedo porque eles beberam muito espumante direto da taça da FA Cup – e por que não?

Com sua típica generosidade, Bonds atribui a vitória ao seu treinador, John Lyall: “John acertou sua estratégia em cheio. Ele puxou Stuart Pearson para o meio de campo e deixou David Cross na frente e jogou com cinco no meio de campo com Geoff Pike perseguindo todo mundo.”

Brooking ecoou o tributo do seu capitão, reconhecendo a capacidade estratégica do treinador: “John disse que o plano de jogo era ter a bola e então passá-la bem. O time do West Ham sempre foi levado a passar a bola e John vestiu o manto de Ron Greenwood e tinha a mesma filosofia de treinamento, a que nos conduziu de volta ao topo na temporada seguinte.

9. Capa da revista Match com a cobertura da grande final

Billy Bonds, Allan Devonshire, Trevor Brooking, Frank Lampard, Alvin Martin e Phil Parkes foram magníficos jogadores do West Ham que seriam incluídos na maioria das escalações de onze jogadores de todos os tempos dos fãs.

Geoff Pike, Ray Stewart e Paul Allen facilitaram o caminho deles a este reconhecimento. O time de 1980 deve ser reconhecido como um dos melhores da história do clube, conduzidos pelo seu mais bem-sucedido treinador, John Lyall.

A FA Cup de 1980 foi a última grande conquista do clube. Desde aqueles gloriosos dias os Hammers têm sido assolados por problemas dentro e fora de campo.

Os anos 80 e 90 trouxeram um estádio muito melhorado, mas às custas de uma imensa dívida, regime de obrigações, um desperdício dos mais excepcionais jovens jogadores por uma geração, incompetência gerencial e farsas da diretoria além da imaginação de Brian Rix – você não conseguiria imaginar. Somente os fãs têm permanecido constantes em sua lealdade e inabalável apoio. Naquele dia de sábado, em maio de 1980, eles mereceram o seu lugar ao sol.

10. Detalhe bordado da camisa da final (eBay)

Ficha técnica:

West Ham 1 (Brooking) Arsenal 0

10 de maio de 1980

Final da FA Cup

Local: Wembley Stadium

Público: 100.000

West Ham: Phil Parkes, Ray Sterwart, Frank Lampard, Billy Bonds, Alvin Martin, Alan Devonshire, Paul Allen, Stuart Person, David Cross, Trevor Brooking, Geoff Pike.

Arsenal: Pat Jennings, Pat Rice, John Devine (Sammy Nelson), Brian Talbolt, David O’Leary, Willie Young, Liam Brady, Alan Sunderland, Frank Stapleton, David Price, Graham Rix. *

* West Ham’s 30 memorable matches - Philip Stevens ©.

11. Conjunto de Cards eternizando os heróis da conquista em 1980 (Nikolai Trading Cards)

Tradução: Sandro Pontes

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